terça-feira, 14 de julho de 2015

FESTAS DE AGOSTO DE MONTES CLAROS I - (I de X)


* Raquel Mendonça

                                                                             Arte: Maria de Lourdes 


"Deus te salve, Casa Santa
Onde Deus fez a morada
Onde mora o Cálix Bento
E a hóstia consagrada (...)"


Quando eu e João Batista de Almeida Costa, o Joba Costa, nos unimos para criar, junto aos então Mestres de Catopês, Marujos e Caboclinhos da cidade, a Associação dos Grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos de Montes Claros, localizada na Rua Humaitá, n° 126, com Santa Efigênia, no Bairro Morrinho, onde mora o Mestre Zanza há longos anos, com o local tendo se transformado, tamanha a beleza, riqueza e autenticidade de seu acervo, em um verdadeiro "Museu do Folclore" ou "Museu do Catopê", pensamos em três pontos básicos, essenciais, fundamentais: a sua não descaracterização ou empobrecimento histórico e cultural, o seu natural fortalecimento e preservação de todos os fundamentos das "Festas de Agosto de Montes Claros", a maior e mais importante manifestação cultural popular e tradicional do município, com quase duzentos anos de existência e resistência, que se realizavam, no passado, sempre nos dias 15, 16, 17 e 18 de agosto, e chegaram a ser consideradas pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional - IPHAN, "Bem Cultural Imaterial da União"!...

A mais antiga notícia que se tem das festas, lembra o grande e saudoso historiador Hermes Augusto de Paula, em seu livro "Montes Claros, sua história, sua gente, seus costumes" (volume "Costumes") é datada de 23 de maio de 1839, quando "Marcelino Alves pediu licença para colher esmolas junto à população e, com isso, poder realizar as Festas de Nossa Senhora do Rosário e do Divino Espírito Santo - às quais se associou depois a Festa de São Benedito - que pretendia fazer nesta freguesia". Quando se comemorou a coroação de Dom Pedro II em 8 de setembro de 1841, depois do cortejo ou passeata com a efígie do Imperador, foram permitidos vários divertimentos durante três dias: "catopês, cavalhadas, volantins e quaisquer outros divertimentos que não ofendam a moral pública."  A partir daí, as Festas nunca mais pararam de crescer e acontecer, livres, belas e soberanas, feitas pelo povo e para o povo, com os catopês ou dançantes, marujos ou marujada, caboclinhos ou caboclada, além de dois atos que não se realizam há muitos anos, de origem popular, única maneira aceita, porque espontânea e legítima: o Bumba meu Boi e as tão concorridas Cavalhadas!...

São festas religiosas, integrantes do Catolicismo Popular de Montes Claros, em honra ou homenagem a Nossa Senhora do Rosário, a São Benedito e ao Divino Espírito Santo. Entre as práticas religiosas, estão as missas, celebradas por longos anos, de maneira entusiástica e contagiante, pelo muito querido Padre João Batista Lopes, o "Padre dos Catopês"; as bênçãos e levantamento de mastros, ou seja, a Bandeira de Nossa Senhora do Rosário, na noite anterior ao Reinado de Nossa Senhora do Rosário; a Bandeira de São Benedito, na noite anterior ao Reinado de São Benedito e a Bandeira do Divino Espírito Santo, na noite anterior ao Império (e não Reinado...) do Divino Espírito Santo, de responsabilidade do Mordomo ou Mordoma, dono de cada bandeira, antecedido pela chamada Visita!...

Aos Festeiros que, normalmente, são famílias da cidade que se apresentam junto ao Mestre Zanza, no final das Festas, para assumirem os Reinados e Império do ano seguinte (antigamente havia até mesmo sorteio, tamanho o número de pretendentes!), pai e mãe que são do Rei ou da Rainha de Nossa Senhora do Rosário, do Rei ou da Rainha de São Benedito e do Imperador ou da Imperatriz do Divino Espírito Santo, que organizam o cortejo ou séquito real/imperial, seguido de príncipes e princesas, entre crianças e pré-adolescentes membros das famílias, convidados ou da comunidade que comparecem com seus pais devidamente caracterizados no dia da festa e podem igualmente participar. Nas cores azul de Nossa Senhora do Rosário, rosa de São Benedito ou vermelho do Divino Espírito Santo! Aos Festeiros cabe ainda oferecer grande almoço aos catopês, marujos, caboclinhos, familiares, amigos das comunidades de cada Grupo, autoridades, convidados, etc, após a Missa na Igrejinha, com apoio, tanto na organização do cortejo, quanto para servir o almoço a centenas de pessoas, de equipe da Secretaria de Cultura! Algumas "novidades" têm sido registradas e devidamente criticadas, o que abordaremos em um dos próximos artigos, com dez já definidos!

E, se são festas religiosas, nada que "ofenda a religiosidade das festas" pode ou deve acontecer - e nada pode acontecer sem a permissão dos Donos das Festas, que são os Catopês -, como, por exemplo, a participação de grupos parafolclóricos, como acabou ocorrendo no ano passado, sob protestos de Mestres, Contra-Mestres, catopês de fila, marujos, caboclinhos, populares... "Somos devotos de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito e do Divino Espírito Santo", não se cansa de dizer o Mestre Zanza (João Pimenta dos Santos), Coordenador das Festas de Agosto, Presidente da Associação dos Grupos de Catopês, Marujos e Caboclinhos de Montes Claros e Chefe do 1° Grupo de Catopês de Nossa Senhora do Rosário. "Não fazemos show, não damos espetáculo, dançamos, tocamos e cantamos por ruas centrais da cidade, da Praça Dr. João Alves (do Automóvel Clube) até a Igrejinha do Rosário, na Praça Portugal", não se cansa Zanza de repetir, cheio de fé e santa devoção! Ou seja, ele não permite nenhuma confusão!

O Professor José Roberto Lopes de Sales (Prof. Beto), Coordenador do Grupo Parafolclórico Saruê, com quem conversamos longamente a respeito no Sobrado dos Versiani-Maurício (Secretaria Municipal de Cultura), nos disse que não "aceitou o convite" (que ainda não se sabe de onde ou de quem partiu), porque entendia que seria interferir (na verdade "inter-ferir") em festas religiosas tradicionais, das quais não participam, nunca participaram!... Muito coerentes e corretas a postura e a conduta do querido amigo, o Prof. Beto, Coordenador de Extensão Cultural da UNIMONTES, um dos ex dirigentes do Museu Regional do Norte de Minas e participante da equipe de Coordenação do Festival Circuito Lago do Irapé, que se realizará em Grão Mogol! Afinal, nenhum dos Grupos Parafolclóricos da cidade é devoto de Nossa Senhora do Rosário, de São Benedito e do Divino Espírito Santo. Fazem bonito também, muita gente gosta, porque, afinal, se inspiram em diversas manifestações culturais tradicionais, a partir das músicas, instrumentos musicais, danças, figurinos e outros detalhes mais, mas em palcos, como, por exemplo, do próprio Festival Folclórico de Montes Claros, este, sim, promovido e realizado pela Secretaria Municipal de Cultura da Prefeitura de Montes Claros, paralelamente às Festas de Agosto, há trinta e poucos anos, criado que foi pela amiga Clarice Maciel, primeira e grande Diretora do Centro Cultural Hermes de Paula, visando aproveitar o movimento das belas Festas, lembrando que o Coordenador de Eventos da Secretaria é Pedro Ferreira!!!

Sugiro a todos assistirem ao filme-vídeo "A Peleja do Bumba-meu-Boi contra o Vampiro do Meio Dia", que vimos durante Encontro Popular de Cultura realizado em Olinda e de que adquirimos cópia depois, fazendo uma pequena mas necessária "vaquinha" para isso, doando-a, em seguida, à nascente Fundação de Artes Ray Colares - FARC. Ele já foi mostrado em vários eventos e acontecimentos culturais, levando informações àqueles que não as têm!...

Se localizado, este é um bom momento para se conhecer, de vez, o cerne da vezes delicada questão, tão debatida, mas pouco entendida, compreendida!
Ou que se busque o teor do 8° Congresso Nacional de Folclore, de que participamos em Salvador e que abordou sabiamente Folclore e Parafolclore!...


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