sábado, 20 de fevereiro de 2016

ANTIGA HOMENAGEM A RAY (RAY COLLARES) EM POESIA:

Ray Collares em poema inacabado...

* Raquel Mendonça (Quando Presidente da FARC)

Raio de luz fulgurante
Mais que tudo, desafiante
Nas trevas da infinita imaginação
Tomada de cores, caminhos e conflitos
Onde a dor de existir e desistir, talvez
Fosse detalhe sem maior importância.

Se foi homem ou menino
O menino foi sempre maior e mais forte que o homem
Ora tranquilo, ora atormentado
Ora alegre, ora triste, transtornado
Ora lúcido, ora alucinado.

Mas o menino acabava vencendo todas as batalhas
E o comandava com segurança varonil
Levando-o de volta, docilmente
Aos brinquedos e folguedos de infância.

E dava-lhe ordens mágicas
Dos álbuns de figurinhas
Dos heróis das revistinhas
Aos esplêndidos gibis
Marco na sua carreira
Que ganhou o país e o mundo.

Foi cor e criatividade a mil por hora
Correndo do tom pastel
Das regras e réguas das escolas de arte acadêmicas
Vivendo e professando a mais completa liberdade de criação
De indomável expressão artística.

Foi ônibus urbano especial, espacial
Que passava voando um após outro à sua frente
Assentado em banco de praça do Rio
Lotado de arte e vanguardismo
Em alta velocidade e vertiginoso talento
Muito tempo adiante de seu tempo.

As faixas laterais se entranhavam inteiramente em sua mente
Perfuravam o seu coração em ato borbulhante de criação
Acabando por explodir nas telas que o tomavam inteiro.

De genialidade desconcertante e torrencial
Varava chuvas, sombras e madrugadas
Banhado de luz e palavra... e mais palavra...

A dor aguda de viver tão livremente
Não doía indefinidamente
E havia momentos de ser feliz como criança.

Batizado Raimundo Felicíssimo Collares
Felicíssimo por ironia do destino
No caminho cheio de pedras, em meio a trevas
E dolorosos espinhos que percorreu
Pesadas e inesperadas pedras
Pesarosos espinhos!...

RAY
COLLARES

RAY
COR
LARES

TODOS OS LUGARES DO MUNDO
COLARES.

Um menino?!
Um homem?!
Um gênio?!
Um gigante?!!!

As faixas fortes e fulgurantes dos ônibus urbanos
Por ele definitivamente reinventadas
Estão entre os brilhos mais intensos de seu trabalho
E haverão de figurar nas laterais do prédio da Fundação de Artes Ray Collares
Definido por outro gênio - da "arte-quitetura" - o Andrey Christoff.

Entre outros espaços culturais importantes, a FARC dará à cidade
O tão sonhado e necessário grande teatro, além de imensa galeria
Em belo e extenso terreno doado por um Mário Ribeiro, o Marão...

Quem nasceu em Grão Mogol, 1944
Diamante histórico do Norte de Minas
Coberto de areias brancas, pedras e rios tempestuosos
Tinha mesmo que se encantar, 1986
No meio de vasto, de repente vazio caminho
De quarenta e poucos anos e planos tantos, inacabados.

Foi poeta de aguda sensibilidade
Nos traços fortes de repentina ternura
De preciosa agenda poética perdida
Em mesa de bar
Em banco de praça
Do Rio imenso
Ou esquecida com algum amigo repentino e distraído.

Tereza (era esse mesmo o seu nome?!)
Amiga do Rio que também o acompanhava, como eu, pacientemente
Pelas ruas e luas da cidade
A resgatá-lo semi-vivo de praias áridas e imaginárias, de íntimas tormentas
Catando pedaços, brilhos e cacos, noite adentro
Recolhendo taças e talheres inúteis dos bares bêbados de surpresa
- Sempre a pedido da mãe preocupada e atenta, Dona Joaninha
Que me ligava tantas e tantas vezes, na madrugada -
Com o mesmo carinho de irmã que todo o tempo experimentei
Nestes montes inóspitos e hostis, então, para a cultura e a arte...

Dono do MAM e do mundo
Percorreu triunfos e tristezas
Glórias, angústias e êxtases
Sem se deixar impressionar
Ou deter muito tempo
Por nenhum deles.

Nas cores e contrastes gritantes
De sua silenciosa agonia
Ou quem sabe intensa e passageira alegria
Tinha ares de cidadão estelar
Quando adentrava a Galeria de Artes do Centro Cultural Hermes de Paula
Ou o NAE/MG, escada acima, onde eu trabalhava
Vestindo elegante conjunto de brim caqui
Para, em seguida, mostrar a outra face do seu humor social
E profundo desprezo pela aparência
Comparecendo descalço e de calças dobradas até o joelho
Mangas arregaçadas e fechos descuidados
Ostentando, no andar ereto, nítido descaso
Pelo espanto dos insensíveis e sensatos.

Deixou obras e marcas por toda parte
Em lares e mais lares de amigos e amigas do peito
De perto ou de longe, pouco importava.

Dos alagados da Bahia
Cristalizando na tela a tênue sobrevivência humana
Sobre as águas e as ruas paradisíacas e perigosas do Rio
Ou esquinas tentadoras e infernais da Itália
Em seus lixos incômodos e solenemente incendiados
Ao ter o peito, o coração dilacerados
Por amor traumático, incomum, impensado.

Lá estava ele, Ray, pura paixão, voando em pincéis e poesia
Ou vivendo os momentos incomuns de terna e eterna agonia.

Foi família de grandes figuras e vivência feliz e sofrida
Dona Joaninha, ah, grande e saudosa mãe, Dona Joaninha
A irmã Terezinha
Fulô, ô Fulô, a flor que enfeitava e a todos - a ele - amparava
Cassimiro, Jorge
Ângela, Fernando
Irmãos e sobrinhos
Grandes quadros no coração guardados
Na mágica poética de seu dia a dia conturbado
Navegando entre o amor e a dor de ser - sem dever ou não - amado.

Na última conversa me disse coisas e brilhos como os poemas prontos:
Viver uma vez só/Viver uma vez/Viver uma. (...)
Diadorim: Dia-dor-im/É a dor/ De Diadorim/Dentro de mim.(...)
Sou homem/ Da mesma maneira/Quero uma mulher/ Um grande amor/ Um filho.

Daí o amor correspondido apenas com a maior e mais pura das amizades!...

Quando ele se foi, fiquei tempos sentindo-o por perto, como se a me proteger
Chegando a ouvir os seus passos me seguindo, os braços me amparando
O mesmo que por ele fiz anos a fio.

Fiquei assim, meses seguidos, sofrendo a perda de um amigo
Mais que especial, muito admirado e querido
Escutando de novo as conversas e confidências no Bar "Kamimdicasa"...

Mas o que verdadeiramente importa
De todas as portas que viveu e abriu
É a arte que fez magistral
Os sonhos que bem ou mal sonhou
- Realizou -
O eterno coração de menino
A imensa saudade de todos
Que aqui ficaram assustados, chocados
Desesperados, desamparados
A dor no coração em chamas!...

E o amor, Rai (com"i", como queria e cobrava)
Ah, o amor
Todo o amor do mundo para Rai
Grande Rai, Rai-mundo!...

Hoje estrela luminosa no céu
Anjo bom e amigo do infinito
Grande, grandioso Rai
Em meio ao silêncio que se fez

O repentino grito!...

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